domingo, 7 de março de 2010

Greve dos Professores do Estado de São Paulo

Acho que está na hora dos professores reagirem a situação ridícula de seus salários enquanto se investe bilhões em rodo anel, ampliação das marginais.
Educação está longe de ser prioritária. Ao mesmo tempo quando se investe pesadamente em infraestrutura rodoviária, e se "economiza" com a educação, esta é uma postura educativa para o meio ambiente. Portanto sempre temos que trazer a tona a pergunta: que meio ambiente que queremos, para que estamos educando?

Segue abaixo uma carta dos professores do Estado de São Paulo em greve.

Davis


Escrito por Flávio Boleiz Júnior às 11h59


Incongruências do secretário

Incongruências nas idéias de Paulo Renato



O secretário de Educação de São Paulo, Professor de Economia Paulo Renato Souza, escreveu artigo no jornal Folha de São Paulo de hoje (04/03/2010) para se defender do que chama de “detratores e seus porta-vozes”, que têm criticado a administração Serra na área de sua pasta.



Economista muito familiarizado com os princípios do neoliberalismo — que marcaram nitidamente sua passagem pelo ministério da Educação durante o governo também neoliberal de Fernando Henrique Cardoso —, ele começa comparando um suposto crescimento do PIB em 5% com a melhoria nas metas em educação num mesmo porcentual.



Aqui já se apresenta um grande problema que demandaria todo um curso de pós-graduação para se poder fazer entender, o senhor Secretário, que, em primeiro lugar, as crianças são diferentes de dinheiro e, em segundo lugar, que o ensino visa a metas antagônicas às da economia capitalista, uma vez que, enquanto que esta visa, inexoravelmente, ao lucro — que é o princípio que incentiva investimentos privados na produção material —, aquela visa à formação de sujeitos livres, cidadãos conscientes e indivíduos felizes.



Se para fazer aumentar o PIB de um país é preciso investir em meios de produção e na exploração de recursos e mercados, para melhorar a Educação das crianças, é preciso fazê-las querer aprender e estudar.



Diferente dos objetos de trabalho que se transformam durante o processo de produção material segundo a vontade do trabalhador, no uso de suas ferramentas e demais meios de trabalho, a criança, por não se tratar de mero objeto inerte e passivo diante do labor docente, tem capacidade e condições de reagir, já que é sujeito de sua própria vontade e só aprende se quiser.



Numa escola como as da Rede Paulista de Educação, pensada ainda nos moldes do ideal dos colégios fundados pela Companhia de Jesus a partir do século XVI, fica muito difícil ao professor ou à professora, por maior que seja seu “mérito”, conseguir que os estudantes queiram aprender e estudar.



As escolas mais parecem pequenas prisões protegidas com grades por todos os lados, com salas voltadas todas para um mesmo pátio, fazendo lembrar, não por acaso, das cadeias e penitenciárias — como é o caso da maioria das escolas estaduais. Os alunos são submetidos a cargas horárias de 4 a 5 horas sentados em carteiras enfileiradas em salas com até 48 crianças, como que se preparando para, obedientemente, se submeterem ao patrão no trabalho industrial.



Além da organização escolar espacial e temporal arcaica, seu currículo voltado para o ensino de conteúdos que, no mais das vezes, não se identificam com a realidade ou a necessidade dos estudantes, faz soar como mero blablablá as ladainhas infindáveis que escutam durante o período diário de escolarização. As aulas não apresentam caráter prático, unidades didáticas oferecidas em laboratórios, hortas ou em outros equipamentos do lado de fora da sala de aula tradicional, que poderiam despertar muito maior interesse dos estudantes, são uma verdadeira raridade, sendo que na maioria das escolas tais atividades pedagógicas de caráter prático sequer existem.



Com tantos problemas, investimentos financeiros que não busquem a reconstrução pedagógica da escola e a reestruturação de sua organização interna, enquanto equipamento educativo, estão fadados ao fracasso, já que visam a melhorar a qualidade num modelo que está falido e que já demonstrou, pelo menos nos últimos 16 anos de administração neoliberal em São Paulo, que não consegue avançar nos índices de avaliação criados por esse próprio governo.



Um avanço de 5% por parte dos estudantes da quarta série é, sem dúvida nenhuma, insignificante. Por mais que o secretário de Educação tente fazer parecer um grande avanço, esses 5% são desprezíveis, já que refletem apenas a adequação de uma pequeníssima quantidade de alunos a uma metodologia educacional que nem sequer responde às necessidades dos próprios estudantes. Se para fazer aumentar o PIB em 5% são necessários grandes investimentos na produção material de um país, para fazer as crianças quererem aprender e estudar, necessita-se, sim de investimento financeiro, mas, acima de tudo, é preciso que se reveja e reconstrua toda a escola, desde sua organização espacial e temporal, até seu currículo, passando por seus objetivos pedagógicos e suas metodologias, que têm se apresentado como sumamente inadequadas a seus fins.



Mais adiante, em seu artigo, Paulo Renato se intitula um “obcecado” pela melhoria da escola pública. Entretanto suas gestões não condizem com seu discurso. Vejamos alguns exemplos de tal disparate.



Já no início de seu artigo, Paulo Renato se mostra desinformado para com o regime educacional do Estado, referindo-se a “alunos da quarta série da rede estadual paulista”. Ocorre que a rede paulista não trabalha com uma educação seriada, mas com o sistema de ciclos de aprovação automática, de modo que não há 4ª série na rede estadual, mas alunos no quarto ano do 1º ciclo de Ensino Fundamental. O uso da terminologia errada por parte do secretário pode até parecer um pequeno detalhe, mas se trata de verdadeiro desrespeito para com um sistema de progressão que enfiado goela abaixo dos educadores da rede paulista pela gestão de seu próprio partido no governo do estado de São Paulo.



Em seguida, Paulo Renato classifica como “brutal infâmia afirmar que o estado culpa os professores por nota baixa dos alunos”, mas sua administração age fomentando a concorrência e a competição entre professores para que, “por mérito” próprio, consigam melhorar os índices dos estudantes.



Horas, se a culpa não é dos professores, porque é que eles precisam de incentivos individuais, tais como premiações por mérito para que seus alunos melhorem? Se os professores não são os culpados pela ma qualidade do ensino, em nada adiantará seu esforço para que se logre alguma melhoria na educação. Entretanto ao considerar que os investimentos na área estão adequados às suas necessidades, que o material pedagógico responde à demanda dos alunos, que as unidades escolares estão bem organizadas e equipadas e, ainda por cima, ao oferecer premiação ao professor que se sair melhor, a administração Serra e seu secretário de Educação estão colocando, sim, a culpa pela má qualidade da escola pública exatamente neles: nos professores!



Mais adiante, em seu artigo, o economista Paulo Renato forja identificar os culpados pela má qualidade da Educação. Num esforço no mínimo muito mal intencionado de ludibriar a opinião geral acerca da responsabilidade pela má qualidade da educação em São Paulo — que é da gestão de seu partido político, pelo menos nos últimos 16 anos —, o secretário afirma que “a equipe que assumiu a Secretaria de Educação desde o início do atual governo considera que os professores são vítimas de um sistema de formação docente que privilegia o teórico e o ideológico em detrimento do conteúdo e da didática.”



Uma afirmação como esta demonstra má fé por parte do governo Serra para com toda a população paulista, ao tentar criar uma cortina de fumaça sobre a própria incompetência na gestão educacional.



Quando era ministro da Educação, o Paulo Renato promoveu a maior farra no Ensino Superior que nosso país já viu. Nunca se abriram tantos cursos na rede privada, enquanto que as vagas nas Universidades Federais ficaram praticamente congeladas, com seus professores vendo seu poder de compra cada vez menor por conta de seus salários que não tiveram reajustes por cerca de 9 anos.



Os cursos em escolas privadas, que vêm formado a absoluta maioria de docentes de nosso país, que se multiplicaram enormemente durante os anos em que Paulo Renato era o ministro da Educação, nunca primaram por qualquer tipo de formação política de seus alunos, deixando muito a desejar, também, com sua formação teórica. Tudo isso é mesmo uma pena, pois se as faculdades tivessem, pelo menos, oferecido uma boa dose de formação teórica e ideológica a seus alunos, talvez os docentes tivessem aprendido a se organizar para melhor lutar por seus direitos e por uma educação de qualidade no estado de São Paulo.



Prosseguindo com seu artigo, cheio do que Paulo Freire chamaria de “palavras ocas”, Paulo Renato se vangloria de ter distribuído “mais de 192 milhões de exemplares” de material de apoio aos alunos e professores. Destaca, ainda, que “nas primeiras séries (olha as séries aí de novo), alocamos professores auxiliares para ajudar nas tarefas do letramento.”



O que Paulo Renato não diz é que o mesmo material é distribuído de maneira arbitrária e impositiva às escolas da rede, como se elas estivessem inseridas, todas, numa mesma realidade. O mesmo material distribuído nas escolas urbanas segue para as escolas rurais, por exemplo, em desalinho completo com a idéia de autonomia pedagógica das escolas, obrigando os alunos a “aprenderem” os mesmos conteúdos que, no frigir dos ovos, são inadequados para todos.



Além disso, o secretário parece não saber dos problemas graves que ocorreram na escolha desse material que, dentre outras pérolas da qualidade, contaram com mapas da América do Sul onde constavam dois Paraguais, com livros paradidáticos que faziam apologia à discriminação cultural e outros que inadequadamente para as idades indicadas, apresentavam palavrões e reprodução de cenas de pedofilia, de uma indecência que só se pode explicar pela incompetência dos gestores da pasta de Educação. Sem falar nos milhões de revistas “Nova Escola”, cuja qualidade deixa muito a desejar, e nos “gibis” da turma da Mônica, que renderam muito dinheiro ao grupo Abril — o mesmo que publica a revista Veja, que apóia incondicionalmente a gestão Serra!



Quanto à alocação de professores auxiliares nas primeiras séries, trata-se de outra falácia, já que as salas de aula continuam apinhadas de alunos (algumas com até 48 crianças) atendidos por um professor e um estagiário, ainda estudante em formação para se tornar professor.



No que tange à formação dos quadros docentes da rede estadual paulista, o secretpario exalta a aplicação de um concurso público para contratação de 10.000 professores, que se realizará no presente mês, como se isso representasse um grande avanço para uma rede que está defasada em mais de 50.000 professores, o que continuará sendo remediado por meio de contratações temporárias.



Finalmente, para não alongar demais este enfadonho rebate aos argumento sem substância do Secretário de Educação de São Paulo, vale destacar que enquanto a escola pública — que se destina à educação do pobres — subsistir ao lado da escola privada — que educa os filhos dos ricos e garante seus interesses —, não veremos melhoria efetiva da qualidade de ensino.



Somente uma educação popular, preparada para responder às necessidades mais práticas da esmagadora maioria de nossa população, com um currículo reconstruído a partir do diálogo democrático com toda a sociedade e com um novo paradigma organizacional dos tempos e espaços escolares, logrará elevar os estudantes de nosso país à categoria de cidadãos conscientes, bem formados e felizes.

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